29.4.13

Vida de passageiro de vida

Os passos tortos dos freios no estacionar. Fecha o livro e entra na multidão.Desce entre as pessoas com pressa de chegar. Corre sem olhar para lado algum para entrar no ônibus lotado de gente que vai.
Esquece a bolsa aberta e pega de volta o livro, se equilibra para ler. Entre frases e quebra-molas também se pode entender. Cada qual se entrete da maneira que der. Tem gente dormindo, com fones de ouvido, falando com a mãe, com o namorado. Gente falando com gente que só vê no amanhecer e só volta a ver quando o sono vem, deixando tempo para um abraço.
Nas curvas se equilibra, se segura pra não desabar. Os pés de motoristas estressados pesam para acelerar. Tudo tem horário pra anotar, naquele caderninho do fiscal.
Nos sinais os cobradores flertam com moças cansadas, sensíveis esperando um simples olhar. Esquecidas nos balcões de madeira boa enquanto o sol se mostra, escondendo rostos e aspirações.
Corre, passa e ultrapassa. Desvia de cão e buraco. Sobe o morro que faz o motor reclamar. Os faróis iluminam as faixas brancas no meio do cinza, que ficam para trás na vertigem veloz.
Levanta o leitor das lotações e aciona o sinal. Percebe um idoso repetindo o gesto, e fica sem entender a repetição, até reparar um pequeno dispositivo atrás das orelhas, que o faz ouvir o pouco que lhe basta perto do muito que nem nos importamos. Abre a porta barulhenta para deixar passar, quem passou o dia todo fingindo respirar, imaginando nas horas que terá no sofá, antes de cair em sono sem se importar, com o jornal ou com a fome que já nem mais grita, e acorda quando o narrador avisa que foi gol do adversário. Levanta, fuma e admira o nada na janela. Espera o travesseiro ser o recanto onde finalmente possa apagar, até tudo, feito um ciclo espinhoso, recomeçar.

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